quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A Afinação no Trombone


A palavra "afinar" significa " tornar  fino,  apurar, aperfeiçoar, purificar, melhorar etc." Em especial, quando um instrumentista toca as notas do sistema diatônico, o som fundamental destaca-se, e os demais aparecem com menor intensidade.

Nossa  cultura musical  é  baseada  na  série  harmônica, em  que uma nota é composta de um som fundamental  e  de u ma  série  de notas  secundárias.Se analisarmos o espectro de harmônicos do trombone  executando  uma  determinada  série  harmônica,  veremos que algumas notas são mais altas  ou  mais  baixas  do  que  o  referencial  estabelecido  pelo sistema temperado. Os intervalos entre as notas precisam de pequenos ajustes (Anexo I).

Existem  aspectos  relacionados  à afinação que vêm das propriedades físicas do som. No entanto, há alguns aspectos que  são  relacionados à cultura. Por exemplo, se emitirmos a série  harmônica de  Sol  bemol,  acima   mencionada  e  incluída  no  anexo I,  e  tomarmos  uma  segunda  série  em Si bemol,  a análise  das  duas  resultantes  mostrará  que  o  Lá bemol, 7 o harmônico da série feito sobre o Si bemol, terá uma freqüência muito mais baixa do que o Lá bemol, 9 o harmônico da série de Sol bemol (Anexo II).

Essa diferença entre notas iguais de séries harmônicas diferentes sempre foi um problema prático dos  instrumentistas  que  lidam  com a família dos metais. Nos primeiros tempos, esses problemas eram causados pelo processo de fabricação, que era artesanal e não tão rigoroso, numa época em que sua tecnologia de construção ainda estava em desenvolvimento.

Afinar, antes de mais nada, é uma atitude que requer disciplina. Não basta ter um bom instrumento um bom repertório,  se  o  músico  não cultivar o hábito de tocar afinado. No entanto, existem duas formas de afinação na música: a absoluta e a relativa.

A  absoluta  depende  da  capacidade  de interiorizar um padrão sonoro, como a escala temperada, por  exemplo.  Já  a  afinação  relativa  depende  do contexto sonoro em que o instrumentista está tocando,  ou  seja,  nela  a  nota  é  afinada  em relação às demais notas com as quais ocorre e não somente em relação ao padrão próprio a que pertence.

A  consciência  do  que  é  necessário  para  obter  uma  boa  afinação requer um desenvolvimento significativo também de outras áreas do conhecimento humano, uma vez que afinar significa ouvir o mundo que nos cerca e percebê-lo  em  sua plenitude. No caso da técnica do trombone, três são os fatores predominantes na afinação:

1) A RESPIRAÇÃO:  é  fundamental  que se tenha um bom controle do fluxo de ar, a fim de mantê-lo constante e uniforme.  Para mudar  de registro ­ do grave para o agudo, ou vice-versa ­ deve-se ter controle adequado em relação à pressão e quantidade de ar.

2) A LÍNGUA: é um fator importante, pois é ela quem controla parte da emissão sonora, obstruindo ou  liberando  a  passagem  de  ar  que  vem  do tórax. Com a língua é possível que a execução das articulações sejam definidas, produzindo as seguintes variações:

a) Stacato ­  Quando  o  instrumentista  deseja uma articulação com o ataque de nota mais seco, a fim de separar bem uma nota da outra, a língua golpeia rapidamente por trás dos dente superiores, causando uma explosão devido à interrupção da coluna de ar.
b) Detachet ­   Quando   o   instrumentista   deseja   uma  articulação  que  possibilite  apenas  uma separação  das  notas,  sem  que haja uma explosão ou ataque brusco, a língua golpeia levemente por trás dos dentes superiores, interrompendo a coluna de ar.

c) Legato ­ quando  o instrumentista deseja uma articulação que destaque uma nota da outra sem que  haja  qualquer  interrupção  da coluna de ar. É mais comum que o instrumentista use o legato para frases mais líricas e grandes cantabiles.

3) A EMBOCADURA:  nos  instrumentos  da  família  dos  metais,  em  que  a  emissão  sonora  se  dá através  da  vibração dos lábios em contato com o bocal, torna-se necessário um condicionamento da musculatura  labial e dos demais músculos da face para que o instrumentista possa controlar e, obviamente,   mudar  a  altura  das  notas  da  série  harmônica.   O  fenômeno  acima  descrito  é  a embocadura. Em resumo, é a forma necessária para a geração  do som nos instrumentos de bocal.

Tocar  afinado  desde  o  início  dos  estudos  pode  ser  a  grande  motivação  de  um estudante de trombone.  No  entanto,  nem  todos  os  estudantes  podem contar com os requisitos naturais que favorecem uma boa afinação. Quando naturalmente não foram consolidados alguns princípios que favoreçam  a  afinação,  cabe  ao professor indicar artifícios que venham a suprir as necessidades referentes  à  afinação.  Alguns  didatas  e  executantes  de  instrumentos de cordas (contrabaixo, celo,  viola   e   violino)  sugerem   uma   afinação  integrada  (BORÉM,  1997,  p.  310-15)  em  que  o desenvolvimento  de  um  sistema  sensório-motor   baseado   na  audição,  tato  e  visão  pode,  de maneira eficaz, minimizar o problema  com a afinação. Com algumas adaptações, o trombone pode fazer   uso   destes  procedimentos  desenvolvidos  para  a  família  das  cordas,  já  que  não  é  um instrumento temperado.

Para esta afinação, é necessária a combinação de cinco técnicas referenciais de afinação:

1) AFINAÇÃO  DINÂMICA:  depende  da  percepção  auditiva  do instrumentista anterior ao contato com o instrumento. Nesse caso, o trombonista corrige a afinação imediatamente quando percebe a  desafinação,  sem  parar  de  tocar.  Para  isso,  o  músico,  que  já  conhece  a  música  que está executando, automaticamente corrigirá a desafinação que estiver cometendo.

2) MEMÓRIA INTERVALAR:  é  a  automatização das distâncias das posições da vara em relação às regiões  físicas  do  instrumento  e  demais  proporções.  Com  a posição da vara fechada (primeira posição),  obtém-se  a  série  harmônica  de  Sib; acima da campana (terceira posição), obtém-se a série harmônica de Lá Bemol; abaixo da campana (quarta posição), obtém-se a série harmônica de Sol; acima da bucha (sexta posição),   obtém-se  a  série harmônica de Fá; abaixo da bucha (sétima posição), obtém-se a série harmônica  de Mi. Proporcionalmente, a segunda posição terá endereço entre  a  primeira  e  a  terceira  posição,  a  quinta  posição terá endereço entre a quarta e a sexta posição.

O   trombone dispõe  de  sete  posições  da  vara,  que  possibilitarão  a  realização  de  sete  séries harmônicas.  Com  a  alternância das posições, é possível a escolha de todas as notas cromáticas. Contudo, estes não são os únicos problemas com a afinação no trombone.

Como o trombone é um instrumento de série harmônica, alguns princípios físico-acústicos exigem correções  nos  harmônicos  executados  nos  instrumentos  de  metal,  visto  que  a  utilização  do sistema temperado exigiu que os instrumentos sofressem alterações  na  sua construção, a fim de serem  mais  dinâmicos  na  performance.  Nesta técnica, a automatização das distâncias deve ser aliada à sensação auditiva e tátil.

3) MEMÓRIA TÁTIL:  está  diretamente relacionada com as sensações desenvolvidas com a prática de  execução  do  instrumento, em que a posição da embocadura, a posição de abertura da vara, a quantidade e a qualidade do fluxo de ar emitido formam um conjunto de sensações que podem ser rapidamente decodificadas pelo instrumentista.

4) MEMÓRIA VISUAL:  geralmente  utilizada  quando  o  instrumentista  toca  em um instrumento de dimensões  diferentes  do  seu  habitual. Nesse caso, para uma boa afinação, ele faz comparações com alguns pontos visualmente.

5) VIBRATO:  o  vibrato,   dentro   das  técnicas  de  afinação,  serve  na  verdade  para  mascarar  a desafinação,   para   confundir   o   ouvinte   quanto  à  imprecisão   na   afinação.  Para  realizá-lo  o instrumentista oscila a nota pouco acima ou pouco abaixo do ponto exato. Este recurso começou a ser bastante utilizado após a implantação do sistema temperado.

Estes  cinco  procedimentos  para  a  afinação  devem  ser escolhidos e combinados na hora certa, caso  contrário,  o  problema  poderá se tornar ainda maior. Seu uso durante todo o treinamento de performance,  ou  mesmo durante  sua  realização,  faz  parte  do desenvolvimento sugerido nestas técnicas.

Referência Bibliográfica


BORÉM, Fausto.
Afinação integrada  no  contrabaixo:  desenvolvimento  de  um sistema sensório-motor baseado na audição, tato e visão. In: X ENCONTRO DA ANPPOM, Goiânia. Anais... Goiânia, 1997, p. 310-15. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário